NAVEGADA PARA JAGUARÃO

   Estávamos muito ansiosos por fazer essa navegada para a região mais ao sul do Brasil pelas Lagoas dos Patos e Mirim. Já vínhamos combinando o passeio há alguns meses com o amigo Emílio Oppits, do Veleiro Adriana, juntamente com o Veleiro Papa-Terra, do também amigo Beto Frichmann e seu tripulante Heloiz. Mas algumas coisas atrasaram nossa ida, do início de setembro para o dia 21. Porém o Papa-Terra não pôde nos esperar e partiu no dia 7, aproveitando o feriado. Sua volta também foi rápida e infelizmente, nós só o encontramos em Pelotas quando já estava retornando.

   A Lagoa dos Patos é nossa conhecida, mas a Lagoa Mirim ficava em nosso imaginário, por conta dos poucos velejadores que arriscavam conhecê-la e vinham contando perigos e maravilhas, pois ela nos reserva alguns particulares importantes. Um deles e o mais difícil é sua pouca profundidade para acessar ancoradouros protegidos, além dos diversos bancos de areia que cortam a Lagoa transversalmente, como o do Fanfa, do Juncal e do Muniz. Os ventos também são muito temidos podendo soprar muito forte, tornando as ondas altas e bem cavadas chegando aproximadamente a 1,50m de altura e tempo de 2 a 3 segundos entre uma e outra. Mas sua beleza de fauna e flora são seus maiores atrativos. Situada no grau 32 de latitude, fica ao lado do famoso Banhado do Taim, que guarda a exuberância silvestre, principalmente nas épocas de migração das aves, além de ficar a uma 10 milhas do Oceano. Isso tudo nos deixava com muitas expectativas. O TAO possui 1,50m de calado e pesa por volta de 10 toneladas, portanto nós não podíamos errar nas escolhas. Depois de intenso estudo da carta náutica, que é totalmente descalibrada, e de "way points" cedidos por navegadores experientes na região como o Sr. Roberto Couto e longas ligações telefônicas questionando em quais arroios era possível nossa entrada fomos de peito aberto para mais este desafio.

    A viagem começou em 21 de setembro de 2011, numa quarta-feira, com ventos brandos do quadrante SW, passando a SE. Ancoramos no Pontal de Tapes, pois havíamos saído tarde, às 11:00 da manhã. Chegamos lá, águas tranquilas, âncora unhada, o Emílio e seu tripulante Sílvio nos convidaram para um tour pelas alagadas do Pontal que prontamente aceitamos. Um lugar só para barcos de pouco calado, mas com um astral e beleza invejáveis.

 

Chegando no Birú.

 

Por do sol no Birú.

 

 

Happy Hour no TAO, Birú.

 

    No dia seguinte saímos com ventos fracos que se terminaram antes do Banco Dna. Maria. O Adriana partira ainda à noite para ganhar tempo. Os encontramos acalmados lhes demos um reboque até a Barra Falsa.

Ancoramos em frente a um banco de areia logo que passa a entrada do canalete de acesso. Notamos nuvens rabos de galo no céu o que destoava da previsão da semana que era de ventos de Leste moderados e céu limpo. A noite foi tranqüila e calma, mas após amanhecer o vento já era de SE e o barômetro caíra consideravelmente. Acordamos cedo e às 7:15 h já seguíamos com todas as velas içadas fazendo boa velocidade. Mas chegando perto do Canal da Feitoria o vento apertou muito, as ondas cresceram, a chuva chegou e a navegada começou a ficar desconfortável. Enrolei a genoa e abri a trinqueta , mas mantive a mesma velocidade, na casa dos 7,5 Knots. Entramos na Feitoria, baixei a mestra e segui com a trinqueta pois é mais fácil de manobra. No través, o vento bateu os 30 knots aparente. Chegamos em Pelotas às 15:30.    

 

 

Mau tempo na Feitoria.

 

    No dia anterior o Emílio telefonara para um amigo pedindo a previsão de tempo para o dia seguinte. Como não seriam ventos confortáveis, ele me passou um rádio avisando que ficaria por lá e só iria a Pelotas no outro dia. Mas quando eles acordaram de manhã, decidiram ir assim mesmo, pois o vento não parecia tão forte naquela hora. Ao entrar no Rio São Gonçalo, que nos leva até Pelotas, recebi um chamado do Veleiro Adriana avisando que estavam na Feitoria e que guardassem um bom lugar no Clube Saldanha da Gama para eles! Ficamos espantados por terem vindo com aquele tempo, mas tanto o barco como seus tripulantes são muito marinheiros. E eles vão provar isso em outra oportunidade!

   Permanecemos em Pelotas de sexta a segunda. No domingo chegou o nosso amigo Veleiro Papa-Terra, um Delta 32, com quilha especial de calado mínimo medindo 40cm, já voltando de Jaguarão.  Eles deixaram o barco em Pelotas para buscá-lo noutro final de semana. Depois de abraços, um bom almoço no restaurante do clube, nos despedimos e eles voltaram de ônibus a porto Alegre. Segunda-feira então, como vento fraco, seguimos nossa viagem através do Rio São Gonçalo. Passamos pelas 2 pontes, pela eclusa e fomos entrando rio acima com o Adriana a contra bordo e sua tripulação no TAO.

A seguir as fotos das pontes:

 

Ponte rodoviária.

 

 

Ponte Ferroviária.

 

O Rio é bem fundo e a paisagem é espetacular, com banhados coalhados de Garças, Jaçanâs, maçaricos, gaviões, João grandes, Tarrãs, Cardeais do Banhado, Biguás, Garças Mouras, Marrecões e muitos outros que desconheço. Em cada curva uma surpresa nos aguardava!

 

 

Subindo o São Gonçalo no contra bordo.

 

Com o binóculo numa mão e a máquina fotográfica na outra, às vezes não sabíamos o que fazer! Lá pelas 14 horas, na altura da Ilha Grande, encostamos no barranco para fazer o tão esperado churrasco, à sombra das árvores e ao som dos passarinhos. Fomos visitados por um verdadeiro gaúcho, com seu cavalo e seu cão dando-nos boas vindas. Pernoitamos por lá mesmo para, no dia seguinte entrar na Lagoa Mirim.

 

 

Garibaldi,

 

Nossos velhos amigos, os Biguás...

 

 

...e a linda garça branquinha!

 

 Dia 27, terça-feira , saímos às 9 horas a motor e chegamos às 11 horas na boca do Sangradouro, início da Lagoa Mirim. É aqui que começam as dificuldades, que vão desde a pouca profundidade como também mangrulhos quebrados a flor dágua, que um dia balizaram o canalete,. Mas tínhamos certeza que o TAO não teria problemas, porque o Papa Terra já nos dera as dicas e seguiríamos os way-points dos amigos.

   Nossa meta era pernoitar no Arroio Chasqueiro, que fica antes da Ponta Alegre, a umas 5 milhas a direita do Sangradouro. Separamos os barcos e fomos velejando com uma brisa de leste. Fomos mantendo o olho no ecobatímetro, pois não tínhamos certeza da profundidade da Lagoa naquela região. A profundidade foi baixando muito lentamente me deixando com certa tranqüilidade. Ao chegarmos na foz do arroio a profundidade mínima bateu 1,70m, mas logo ao entrar foi subindo aos 3m. Fizemos a primeira curva para a esquerda e embiquei a proa para o barranco. Ali o eco leu 6m de profundidade!

 

Chegando no Arroio Chasqueiro,

 

"Ancorado" no barranco,

 

TAO e Adriana, no Arroio Chasqueiro.

 

 

 Ao chegar vimos algumas Emas com filhotes ao longe. E bem na nossa frente havia um banhado com Maçaricos, Talha-mares, Garças e sabiás chafurdando atrás de alimento. Coloquei a âncora em frente, no capim bem enterrada e outra âncora menor pela popa. Ficamos novamente com os barcos a contra bordo. Fizemos um lanche e fomos dar um passeio, eu, a Marga e o Sílvio. Caminhamos bem quietinhos para observar os pássaros bem de perto onde havia um arvoredo nativo. No chão encontramos ovos desenterrados e quebrados, que pareciam ser de tartarugas, encontradas por algum Graxaim esperto. Ao longe havia uma fazenda com o gaúcho a cavalo e os cães em volta. Decidimos voltar para evitar algum problema depois de encontrar pegadas numa praínha, que imaginamos serem de cães grandes. Na volta quase que eu piso numa cobra, se não fosse o Sílvio me avisar em tempo! Estávamos todos sem botas, apenas calçávamos tênis e bermudas. É assim que acontecem os problemas!              

   Passamos uma noite maravilhosa e céu estrelado, mas o vento tinha aumentado e rondando para NE, que poderia fazer baixar o nível da água naquele lado da Lagoa. Nossa vontade mesmo era de ficar ali alguns dias, mas o mais certo era seguir em frente. 

   Levantamos cedo e começamos nossa saída do arroio. Segui exatamente o mesmo caminho da entrada, mas a Lagoa tinha baixado uns 20 cm. Logo depois da boca, a profundidade caiu para 1,50, ou seja, passamos colados no fundo, mas sem trancar. Içamos as velas mestra e trinqueta, e com o vento soprando por volta de 15 knots numa orça folgada, o TAO começou a andar rápido. Ultrapassamos o Adriana que havia saído antes e pelas 9:00 já contornávamos o Farol da Ponta Alegre.

 

Farol da Ponta Alegre, Lagoa Mirim.

         

   Com novo rumo o vento ficou bem empopado, mas dava para seguir só com a vela mestra. O vento foi apertando e fazendo crescer as ondas. O Adriana em "asa de pomba" pendulava bastante na nossa popa. Mantivemos a mesma distância por muito tempo. Horas depois o vento estava muito forte e as ondas haviam crescido muito. Nossa idéia inicial era pernoitar no local chamado Caldeirinha, mas o Emílio achou que seria difícil entrar lá com essas ondas quebrando por todos os lados. Decidimos então seguir direto para o Rio Jaguarão e pernoitar em algum lugar no meio do caminho para a cidade. Ao contornar o mangrulho do Banco Juncal, as ondas e o vento passaram para o través, piorando as coisas. De olho no rumo e na estação de vento, vimos o vento bater a casa dos 30 knots até chegar nos seu máximo: 38 knots aparente! Contornamos mais um mangrulho e, agora num contravento, seguimos a 3 knots para a boca do canal. Logo depois estávamos em águas abrigadas. O Adriana cortou caminho, pois seu calado não oferecia nenhum risco, aproximando bastante de nós.

 

Foz do Rio jaguarão, Marco Territorial do Brasil e,

 

o Marco Territorial do Uruguai.

 

  Estávamos no famoso Rio Jaguarão e tudo dera certo. Escolhemos pernoitar na Sanga dos Mendes, bem no fundo, dica do Sr. Roberto Couto via celular do Emílio. O lugar é abrigado de todos os ventos e com boa profundidade para nós.   

 

Por do Sol na sanga dos Mendes.

        

  Acordamos pelas 8:00 h e, depois do café e de observar a região em volta, seguimos em contrabordo até a cidade. O dia estava lindo, com poucas nuvens e pouco vento. Antes de chegar na parte do Rio onde começam os famosos "espigões", uma nuvem horizontal foi chegando e, com ela  vento forte. Decidi ancorar e esperar melhorar as condições. Não queria passar pelos tais espigões com vento para dificultar. Vinte minutos depois a nuvem passou, o vento acalmou e seguimos até o Iate Clube Jaguarão. Os espigões, que foram construídos a muito tempo para evitar assoreamento da encosta, são muros de pedra que vão da margem até o meio do rio, alternando o lado conforme o leito do rio e que, nesta época do ano ficam submersos, sem nenhuma bóia ou estaca que avise onde se encontram, tornando o caminho extremamente perigoso. As fortes correntezas do rio em dias de cheia tornam infrutíferas as iniciativas de colocar algum tipo de bóia ou estaca delimitando o canal. Para passar pelo local, só com way points muito bem plotados no GPS e sangue frio!

 

Chegando no Clube Náutico Jaguarão.

 

 

Os amigos no trapiche.

 

Vista da cidade de Jaguarão, estes sarandis dentro d'água,

crescem sobre os temidos espigões...

 

Fomos chegando e, monitorados pelo Sr. Amarildo Porto e ajudados também pelo Sr. Moreira e sua esposa, encostamos no trapiche. Colocamos uma âncora na popa para ajudar na saída. Pegamos os cabos de 2 poitas e também amarramos na popa. O Adriana encostou depois. Fomos muito bem recebidos por alguns que já sabiam de nossa chegada. Nós estávamos ansiosos em reencontrar o Comandante Ernesto Pires e seu tripulante Antônio Azambuja, do veleiro Rebojo, 30 pés que encontramos em Florianópolis quando eles voltavam da Regata Refeno. Naquela ocasião eles voltavam trazendo o troféu de veleiro participante mais distante.  

 

 

Vista da cidade em direção ao clube.

Vemos o mastro do TAO bem a direita.

 

 

 

 

 



30/12/2011

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